Você passou a vida se sentindo “diferente”, lidando com desafios que pareciam mais difíceis para você do que para os outros? Talvez tenha sido chamada de “sensível demais”, “distraída”, “intensa” ou “desorganizada”, e, por muito tempo, tentou se adaptar a um mundo que parecia não ter sido feito para você.
Se recentemente você recebeu um diagnóstico de TDAH, autismo, altas habilidades/superdotação ou outro tipo de neurodivergência na vida adulta, é natural que muitas perguntas apareçam. Afinal: como reconstruir a própria história a partir dessa descoberta? O que muda, e o que permanece?
Neste texto, vamos conversar sobre o que as pesquisas mostram sobre diagnósticos tardios, os impactos dessa descoberta e como você pode começar um caminho mais gentil e consciente consigo mesma.
O que é neurodivergência?
O termo neurodivergente se refere a pessoas cujo funcionamento neurológico é diferente do que é considerado “típico” ou “neurotípico”. Isso inclui condições como o Transtorno do Espectro Autista (TEA), Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), dislexia, dispraxia, entre outros.
Essas diferenças não são defeitos ou doenças a serem “consertadas”, mas sim variações legítimas na forma como o cérebro processa o mundo, sente, percebe, aprende e se relaciona.
O que dizem as pesquisas sobre diagnósticos tardios?
Estudos recentes mostram que o número de adultos recebendo diagnóstico de TDAH e autismo tem aumentado significativamente, especialmente entre mulheres e pessoas que cresceram em contextos onde seus traços foram mascarados por estratégias de adaptação.
Essa camuflagem social, ou masking, é descrita em pesquisas como uma tentativa inconsciente de esconder comportamentos considerados “atípicos” para se encaixar nas normas sociais. O problema é que essa camuflagem cobra um preço alto: ansiedade, exaustão, autocrítica, crises de identidade e até burnout.
Muitos adultos relatam ter vivido anos com sofrimento emocional, relacionamentos difíceis ou desafios no trabalho, sem compreender de onde vinha essa sensação persistente de inadequação.
A descoberta: um alívio ou um luto?
Receber um diagnóstico tardio pode ser vivido de forma ambivalente. Para algumas pessoas, é como colocar os óculos certos pela primeira vez: tudo começa a fazer sentido. Para outras, o diagnóstico também vem acompanhado de tristeza e raiva, por tudo o que poderiam ter vivido de forma diferente se tivessem sido compreendidas antes.
É comum surgirem sentimentos como:
- “Se eu soubesse disso na infância, minha vida escolar teria sido outra…”
- “Quantos relacionamentos eu perdi por não entender meus limites?”
- “Passei a vida achando que o problema era só comigo…”
É importante lembrar: essas emoções fazem parte do processo de integrar essa nova compreensão sobre si mesma. Não se trata de definir toda sua identidade por esse diagnóstico, mas de acolher uma parte sua que talvez tenha sido silenciada por muito tempo.
O que muda com o diagnóstico?
Saber que você é neurodivergente na vida adulta pode abrir caminhos para o autoconhecimento, o cuidado e escolhas mais alinhadas com a sua forma de funcionar no mundo.
1. A autocompreensão se torna mais compassiva
Você começa a revisar sua história com novos olhos. Compreende que nem tudo foi “falta de esforço” ou “drama”, mas parte de um sistema nervoso com necessidades específicas.
2. O autocuidado se torna mais estratégico
A partir dessa nova lente, é possível aprender quais estratégias funcionam melhor para você: desde a organização da rotina até a forma como lida com estímulos sensoriais, relações sociais ou sobrecarga mental.
3. As relações podem melhorar
Ao comunicar suas necessidades com mais clareza, você começa a se relacionar com mais autenticidade. Isso pode significar redefinir laços, estabelecer limites e buscar conexões mais seguras.
E agora, por onde começar?
Essa jornada é única para cada pessoa, mas algumas direções podem ajudar:
- Busque informação de qualidade, baseada em ciência e na perspectiva de pessoas neurodivergentes.
- Procure profissionais que compreendam a neurodivergência, especialmente em mulheres e adultos.
- Participe de grupos de apoio ou comunidades neurodivergentes, que podem oferecer acolhimento e identificação.
- Pratique a autocompaixão, você está (re)conhecendo partes de si, e isso leva tempo.
Neurodivergência e saúde mental
Pessoas neurodivergentes costumam ser mais vulneráveis a desenvolver quadros de ansiedade, depressão ou burnout, especialmente quando tentam viver constantemente num modo de “máscara”.
Por isso, terapias baseadas em autocompaixão, como a Terapia Focada na Compaixão ou abordagens da Psicologia Positiva, podem ajudar na reconstrução da autoestima, na redução da autocrítica e no fortalecimento da autonomia emocional.
Conclusão: você não está sozinha
Descobrir que é neurodivergente na vida adulta pode ser o início de um processo de cura. Não porque você precisa se “consertar”, mas porque pode finalmente parar de lutar contra quem você é, e começar a construir uma vida mais leve, coerente e respeitosa consigo mesma.
Como diz a escritora autista Devon Price:
“Não é que você falhou em ser normal. É que o mundo falhou em reconhecer que você já é incrível do jeito que é.”
Se você está vivendo esse momento de descoberta, talvez seja a hora de buscar apoio terapêutico. Aqui no Psicoterapia e Afins, trabalhamos com escuta especializada, abordagens baseadas em ciência e, acima de tudo, muito respeito pelas suas vivências.
🧠💚 Você merece se conhecer, e se cuidar, com verdade e gentileza.
Com carinho,
Paula.